Pode-se afirmar que o processo de colonização na Amazônia inicia-se do Oceano Pacífico para o Atlântico, a partir de 3 de setembro 1542. Os fatos e as ocorrência estão tombadas no “Relatório escrito pelo Frei Gaspar de Carvajal, da ordem de Santo Domingo de Guzman, sobre o novo descobrimento do famoso Rio Grande, descoberto por graça divina, desde a sua nascente até à sua foz, pelo capitão de Orelhana e pelos cinquenta e sete homens que partiram com ele e se lançaram à aventura pelo Rio, que em honra do capitão que o descobriu, foi batizado o Rio de Orelhana”.
Para Gonzalo Pizarro, irmão de Francisco Pizarro, conquistador afamado pelos seus males, bem como para Coroa Espanhola, Orelhana não passa de um “rebelde desalmado” que concretizou “a maior crueldade que nunca homens sem fé tenham demonstrado” por violar o mando imperial. Na versão de Carvajal, a narrativa é outra ampara-se na “honra e penúria”. Visto que, quando o “capitão Orelhana percebeu o que acontecia e se conscientizou da grande penúria pela qual passavam, e ao constatar que havia perdido tudo o que possuía, pareceu-lhe que não seria honroso retornar após ter pouco que lhe restava com eles e que seguiria rio abaixo”.
OS OMÁGUAS, NO SOLIMIÕES: No Relatório do Frei Carvajal consta que “ao completar doze dias de maio (1543) chegamos às províncias de Machiparos (cacicados dos Omáguas, no rio Solimões). (…) Machiparo está localizado em um planalto no rio, e tem uma grande população de cerca de cinquenta mil homens para a guerra, cuja a idade varia da trinta a setenta anos, porque os jovens não vão para guerra e em todas as batalhas que travamos com eles, nunca os vimos, a anão ser velhos muito dispostos, com bigodes, mas sem barbas”, (os parênteses são nossos).
A narrativa quinhentista pode ser minimizada. Contudo, expressa valores quantitativo e qualidade dos Omáguas, que historicamente viveu e se disseminou na região do Alto Solimões.
Na mesma perspectiva, o capitão-tenente, Lourenço da Silva Araújo E. Amazonas, em seu Dicionário Topográfico, Histórico, Descritivo (1852), ao se referir ao Solimões em seu verbete qualifica-o da seguinte forma: Região do Alto-Amazonas, compreendida entre o Rio Madeira, Amazonas, Solimões e Javari.
Quanto aos indígenas, o autor do Dicionário afirma haver “mais de 70 nações indígenas se hão conhecido neste território, das quais mais se recommendão os Múras por sua indiferença pela civilização, os Júmas por sua indocilidade, os Purupurús por sua cútis foveira (ruivo), os Cauanás por sua mesquinha estatura, os Cambébas por sua docilidade e genio para civilização, e os Mairunas por sua excessiva antropophagia”.
Nesta viagem pelo Solimões, como bem descreve Santa-anna Nery em sua obra “O País das Amazonas” (1899): “O alto Amazonas recebe numerosos afluentes. A esquerda, quando se sobe, partindo de Manaus, encontramos: o Manacapuru (rio dos mais belos habitantes), o Jurupari-Pindá (reio do anzol do diabo-índio), o Codajás, o Japurá, o Copeá, o Tocantins, o Itaqui, o Mniatuba, o Tabatinga etc; à direita: o Purús, o Mamiá, o Coari, o Urucuparaná (o rio urucu), o Taruá, o Giticaparaná, o Caiamé, o Tefé, o Juruá, o Jutaí, o Jundiatuba, o Comatiá, o Jurupari-Tapera, o Capacete, o Javari, o Curuçá, o Xiquirana, engrossado pelo Rio Preto, e muitos outros”.
A região do Alto Solimões, aqui circunscrita em nove municípios: Amaturá, Tabatinga, Atalaia do Norte, Benjamin Constant , Fonte Boa, Jutaí, Santo Antônio do Içá, São Paulo de Olivença e Tonantins.
Contudo, registra-se que na literatura etnológica conceituada pelo Instituto Socio Ambiental a configuração étnica á a seguintes: Solimões (Kaixana, Kambeba, Kanamari, Karapanã, Matsés, Miranha, Mura, Ticuna, Witoto) Javari ( Kanamari, Korubo, Kulina, Kulina Pano, Marubo, Matis, Matsés – Mayuruna – Tsohom Djapa e os povos isolados) e Juruá/Jutaí/Purús (Apurinã, Banawa Yati, Dani, Jamamadi, Jarawara, Juma, Kanamari, Katukina, Kaxarari, Kulina Paumari Yaminauwá, Zuruahã e povos Isolados).
Formalmente, nos primeiros estudos etnológicos os autores quase sempre seguiam uma circunscrição das fronteiras territoriais determinadas por áreas física do Estado e ou do Município para identificação étnico dos povos indígenas da região, sendo que, atualmente, na prática etnográfica mais consistente trabalha-se com as fronteiras humanas e suas configurações linguísticas por serem mais dinâmicas do que as físicas por serem estáticas.
Especificamente, na área do Solimões estima-se entre 75 a 80 mil indígenas, destacando sobretudo os Ticuna, por serem a maior família linguística da Amazônia estimada em 40 mil indígenas, totalizando desta feita 18 povos distintos e diferenciados distribuídos em 350 comunidades/aldeias com populações de diversos tamanhos na Região do Solimões.
Como dissemos anteriormente são notas preliminares para seduzir os interessados para pesquisa etnográfica, etnolinguística e etnológica pautada pela matriz da geopolítica do Brasil no Amazonas, a começar pelo Solimões.
(*) É professor, antropólogo e coordenador do NCPAM do Dpto. de Ciências Sociais da Ufam. E-mail: ademiramos@hotmail.com
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