Brasília-DF – Senadores acusaram a empresa farmacêutica Vitamedic, na reunião da CPI da Pandemia desta quarta-feira (11), de lucrar milhões de reais com a venda de ivermectina, à custa de milhares de vidas perdidas para a covid-19. O depoente do dia foi Jailton Batista, diretor-executivo da empresa. Pressionado pelo relator da CPI, senador Renan Calheiros […]
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Brasília-DF – Senadores acusaram a empresa farmacêutica Vitamedic, na reunião da CPI da Pandemia desta quarta-feira (11), de lucrar milhões de reais com a venda de ivermectina, à custa de milhares de vidas perdidas para a covid-19. O depoente do dia foi Jailton Batista, diretor-executivo da empresa.
Pressionado pelo relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL), Jailton alegou não dispor de todos os números de vendas e faturamento da empresa antes e depois da pandemia. Admitiu, porém, que a venda da ivermectina — medicamento vermífugo e antiparasitário cuja eficácia contra a covid nunca foi cientificamente comprovada — saltou de 2 milhões de unidades de quatro comprimidos em 2019 para 62 milhões no ano passado. Somente com a ivermectina, a empresa faturou R$ 15,7 milhões em 2019, número que passou a R$ 470 milhões em 2020 e, de janeiro a maio deste ano, já atinge R$ 264 milhões.
A ivermectina foi apregoada em várias ocasiões pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, e seus apoiadores como parte do chamado “kit covid” para o suposto “tratamento precoce” da doença. No Brasil, a Vitamedic é um dos principais produtores do medicamento, também vendido por outros laboratórios, como Abbott, Legrand e Neo Química.
A pedido de Renan Calheiros, foram exibidos diversos vídeos em que Jair Bolsonaro promove a ivermectina. Jailton Batista se disse, porém, incapaz de avaliar o impacto dessas declarações sobre a demanda pelo remédio.
— Antes que houvesse alguns pronunciamentos, desde a eclosão da pandemia, quando os primeiros estudos in vitro apontaram que a ivermectina tinha alguma ação, isso desencadeou o interesse pelo produto. Ele passou a ter visibilidade maior. Mas não temos como medir o que impactou a fala do presidente no nosso negócio — disse Batista.
As respostas foram consideradas evasivas pelo relator:
— Nós estamos diante de um dos mais tristes depoimentos desta Comissão Parlamentar de Inquérito — resumiu Renan.
Diversos senadores, entre eles o relator Renan Calheiros e Otto Alencar (PSD-BA), defenderam a convocação do dono da Vitamedic, José Alves Filho, para prestar mais esclarecimentos. O requerimento original previa a presença do empresário nesta quarta-feira. Mas em ofício enviado à comissão, Alves argumentou que, como acionista da Vitamedic, poderia responder apenas sobre “investimentos fabris e novas aquisições” e sugeriu o nome de Jailton Batista. O vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), anunciou que Alves será chamado.
No depoimento, Jailton Batista reconheceu que a Unialfa, empresa do setor de educação que pertence ao grupo de José Alves, patrocinou um manifesto da Associação Médicos pela Vida, defensora do “tratamento precoce”, sobre “medicamentos contra covid-19”, publicado na imprensa em 16 de fevereiro deste ano.
O presidente da CPI, Omar Aziz, exaltou-se ao lembrar que a ivermectina continuou sendo recomendada no auge da crise de oxigênio que matou centenas de pacientes de covid-19 em Manaus no início deste ano:
— Esse manifesto é depois da morte de mais de 200 pessoas por dia na cidade de Manaus. E nem isso sensibilizou o laboratório a perceber que era um engodo. Não! Visou lucro, mancomunado com alguns médicos. Se isso não for crime, não tem mais nenhum crime para a gente investigar aqui nesta CPI — declarou.
Jailton Batista defendeu a empresa alegando que ela não tinha como interferir no conteúdo do informe publicitário elaborado pela Associação Médicos pela Vida.
Em resposta a Otto Alencar, Jailton Batista negou o pagamento de bonificações a médicos para estimular o uso da Ivermectina. O senador mostrou, então, documentos segundo os quais cerca de R$ 10 mil teriam sido pagos a médicos. O depoente confirmou o financiamento de diárias para a realização de palestras sobre a medicação destinada ao “uso preventivo” contra covid-19. Ele negou a instalação de outdoors com propaganda desses remédios em estados como a Bahia.
A senadora Soraya Thronicke (PSL-MS), que teve sequelas no fígado pelo uso de ivermectina para tratar a covid, acusou os promotores do medicamento de ter “as mãos sujas de sangue”. O senador Rogério Carvalho (PT-SE) solicitou à CPI que encaminhe uma denúncia à Procuradoria-Geral da República contra a Vitamedic, por prescrever medicamento sem eficácia contra a covid-19 e por curandeirismo, infração de medida sanitária, advocacia administrativa, corrupção ativa e passiva e publicidade enganosa.
Os senadores Izalci Lucas (PSDB-DF) e Eduardo Girão (Podemos-CE) manifestaram surpresa com o aumento do preço da ivermectina, de cerca de 60% desde o início da pandemia. Segundo Jailton Batista, a variação ocorreu devido ao aumento no preço da matéria-prima do medicamento, à elevação de custos em razão da pandemia e à variação cambial.
O relator Renan Calheiros informou que a CPI vai recomendar que as defensorias públicas nos estados processem a União e as empresas produtoras do “kit covid” pelas mortes durante a pandemia. O anúncio contou com o apoio de Omar Aziz, Randolfe Rodrigues e Humberto Costa (PT-PE).
— Será item obrigatório do relatório final que a advocacia dos estados atue em defesa da tutela dessas vítimas, de seus familiares e de suas famílias, e das pessoas que ficaram sequeladas em razão da prescrição desses medicamentos sem eficácia — disse Renan.
O senador Fabiano Contarato (Rede-ES) sugeriu que seja feito um pedido cautelar à Justiça Federal pra que bloqueie, enquanto durar a investigação, recursos da Vitamedic suficientes pra garantir o ressarcimento aos cofres públicos de eventuais prejuízos causados pelo uso indiscriminado da ivermectina.
Senadores independentes da base do governo defenderam a atuação dos médicos que receitam a ivermectina a seus pacientes. Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), líder do governo no Senado, afirmou que o relator não pode responsabilizar a Vitamedic pelo aumento na produção e nas vendas do medicamento. Para o senador Marcos Rogério (DEM-RO), o “tratamento precoce” foi indevidamente politizado, e os médicos que continuam a receitar esses remédios não devem ser criminalizados.
O senador Marcos do Val (Podemos-ES) afirmou que o presidente da República, Jair Bolsonaro, nunca receitou medicamentos. O senador relatou estar se recuperando da covid e atribuiu seu bom estado de saúde ao fato de ter recebido duas doses da vacina da Pfizer.
Em sua intervenção, o senador Luis Carlos Heinze (PP-RS) pediu para exibir um vídeo de uma entrevista antiga do colega o senador Otto Alencar, em que este admitia (no início da pandemia, contrariamente ao que defende hoje) a prescrição de ivermectina diante dos sintomas iniciais da covid-19. Ocupando interinamente a cadeira da presidência, a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) indeferiu o pedido, alegando que a entrevista era antiga, que o entendimento da ciência evoluiu desde então, e que seria um “desrespeito” a Otto, que se recupera da covid e não estava presente para rebater.
Apesar do indeferimento, Heinze divulgou pelo microfone o áudio da entrevista de Otto. O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) anunciou que anexaria o episódio à sua representação no Conselho de Ética contra Heinze por disseminação de informações falsas.
Foi aprovado na reunião requerimento protocolado por Randolfe Rodrigues para acareação entre o atual ministro do Trabalho Onyx Lorenzoni e o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), devido às contradições das declarações de ambos em relação ao caso Covaxin, de suspeita de irregularidades na compra de vacina indiana. Miranda denunciou corrupção nas negociações da Covaxin no âmbito do Ministério da Saúde, enquanto Onyx negou as acusações.
*Agência Senado
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